quinta-feira, 10 de abril de 2014

Looking



Ontem eu li essa crítica sobre a 1ª temporada da série “Looking” (Um retrato dos defeitos que os gays não admitem ter). Apesar de bem construída, com muita “verdade” sendo dita, acredito que existem alguns exageros. E o primeiro deles é certa generalização conceitual a partir de uma simples e singela série de TV. E que, convenhamos, está muito longe de ser uma obra de arte, ou um tratado filosófico sobre a vida e o comportamento dos gays. Entretanto, como crítica, vale a pena se dar uma “sapeada” (rs). Em especial, gostei da análise que ele faz do Patrick, talvez o personagem principal da série.

Em uma conversa com um amigo (que, inclusive, chega a se identificar, em alguns pontos com o dito personagem, rs), o papo acabou se encaminhando para a questão dos valores que atribuímos à vida, às pessoas que nos cercam, e como isso muda à medida que envelhecemos. Sei que isso é bem chavão e, inclusive, tendendo à pieguice, mas não tenho dúvida: o nosso envelhecimento, ou acúmulo de experiência de vida, como queiram, nos faz, por um lento processo interno, rever uma série de valores que tínhamos na juventude.

Uma cena de “Looking” me tocou profundamente: quando o “namorado” do Patrick, Richie (um jovem latino, pobre, sem muita ambição na vida, mas, a meu ver, o único verdadeiro, sincero e sensível ali!), uma bela noite, como que pra “selar” um compromisso, dá a ele um escapulário. O significado daquele gesto, o sentimento envolvido, o querer o bem, a proteção oferecida pelo escapulário, me tocaram demais. De certa forma eu já ganhei, um dia lá no passado, um “escapulário”. Qual valor eu atribui a aquele gesto vivido no meu passado? Da perspectiva de hoje, esse valor adquiriu um novo significado?

Vou descrever, sucintamente (rs), a minha “cena”. Foi num natal. O “meu Richie” (que, no caso, era o Fernando), me deu de presente uma imagem de Nossa Senhora. Simples. Feita de gesso. Ele foi aprender a pintar em gesso e, com o maior esmero possível (pincéis, tintas, betume, etc.), fez a imagem. Com uma base de feltro, numa caixa de madeira, forrada de veludo... E eu... dei a ele a coleção completa dos discos (5 LP’s... que coisa! rs) de Woodstock! Conseguem imaginar o “conflito de valores” presente nos presentes? Ele não tinha grandes ambições na vida. Pra ele era “o máximo” ser professor de português e eu de filosofia. Ele queria, um dia, poder comprar um pequeno apartamento. Ele queria ter um cachorro, viajar nas férias (quem sabe, para alguma pousada...). Eu... queria muito mais!

Teve um natal, muitos anos depois (e eu, correndo atrás do “muito mais”), já casado, ela, que havia voltado de um congresso em Atlanta (USA), me trouxe de presente um “kit CK”. Três calças jeans, 4 polos, várias cuecas, meias, cinto, carteira, o escambau! Era uma maravilha! Era o “muito mais”, cada vez mais, enchendo os meus olhos e as minhas certezas de que eu estava certo. Que os meus valores valiam a pena.

Hoje, mais de 30 anos depois... o que foi feito do meu “kit”? A imagem da santa, essa ainda está comigo...




4 comentários:

  1. sim esta questão de revermos valores com o passar do tempo é próprio do Ser ... bem, pelo menos para alguns pois, outros permanecem na mesmice. eu revi e revejo ainda muita coisa ...
    Qto à série assisti a primeira temporada e sinceramente não gostei muito não ... bem inferior a QF ...

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    1. QAF era outra vibe, Paulo! (rs) Hoje os tempos são outros. Em alguns aspectos, até mais conservadores.

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  2. E quem diria que uma critica azeda pudesse render tanto, né?!
    Confesso que salvo as generalizações e exageros, ainda gastei um tempo pensando...
    E em relação aos "presentes", ainda que exagerado ou que os valores não estivessem em sintonia, vocês trocaram... lembra do "E o que você ganhou?!" :P

    Muito bacana você ainda ter a Santinha... Abração.

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  3. Estou com o Latinha. Houve a troca. Que bom.

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