terça-feira, 1 de abril de 2014

Time Has Told Me



Hoje abordaremos mais um enigma sobre Nick Drake. Já foram analisados, à exaustão, por vários pesquisadores, muitos aspectos envolvendo a sua problemática e confusa trajetória de vida. Inclusive existe um documentário, à primeira vista muito bem feito, sobre sua vida e obra. Para quem tiver curiosidade, segue o link do vídeo legendado: A Skin Too Few.

Em minha singela opinião é um documentário “chapa branca”! (rs) Tudo o que é dito e mostrado foi cedido pela família, principalmente sua irmã. Explica-se muita coisa relacionada à personalidade depressiva dele... sua baixa autoestima (ele se achava feio e desengonçado, vê se pode!), a busca incessante pelo perfeccionismo musical (em nenhuma música tocada por violão, por exemplo, escutamos aquele “sonzinho” dos dedos deslizando pelas cordas... e quando acontecia, ele iniciava uma nova gravação!), o uso de drogas, etc. E, nenhuma palavra sobre o seu lado sentimental e amoroso! Bem estranho, né!

Fato: ele nunca foi visto ou teve oficialmente um relacionamento amoroso. Especula-se muito sobre uma possível homossexualidade, negada pela família. Possível? Vou me ater a apenas uma de suas músicas que trata mais diretamente sobre o “encontro do amor”. Trata-se de Time Has Told Me, primeira faixa do primeiro álbum (Five Leaves Left de 1969).

Primeira “curiosidade”: entre suas diversas manias, Nick era um organizador sistemático e meticuloso de todas as suas coisas. Por exemplo, todos os manuscritos das letras de suas músicas eram cuidadosamente arquivados por ordem cronológica. E mais: ele sempre anotava em que condições escrevia, onde, como e, mais importante, para quem ele dedicava a canção.

E não é que o manuscrito de Time Has Told Me sumiu! Ninguém sabe, ninguém viu... Mas, só esse? Não! Mais uns 4 ou 5... justamente de músicas mais, digamos, “reveladoras”. Inclusive de uma das mais famosas (e de que eu mais gosto!), Northern Sky. Dessa falarei em outro post. (rs) Fiquemos apenas na que nos propomos analisar...

Em primeiro lugar, é uma canção dirigida a alguém (o que não é comum na maioria das outras músicas, sempre falando sobre si mesmo). Parece uma pessoa por quem ele, no mínimo, está apaixonado. Hipótese de trabalho (rs): seria alguma garota que ele conhecia. Um fato interessante: existem duas estrofes “espelhadas”... uma dirigida a ele mesmo e outra a uma “certa pessoa”. Vejamos:

Então deixarei aquilo que está me fazendo ser
O que eu realmente não quero ser
Deixo aquilo que está me fazendo amar
O que eu realmente não quero amar

Então deixe aquilo que está fazendo você ser
O que você realmente não quer ser
Deixe aquilo está fazendo você amar
O que você realmente não quer amar

Parece que ele está falando sobre obstáculos, inclusive incitando (a ambos!) que rompam com velhos padrões e que simplesmente amem o que deve ser amado... um ao outro! Correto? (rs) Qual a necessidade disso se esses versos fossem dedicados a uma mulher? Que obstáculos e padrões teriam que ser rompidos?

No documentário que citei, certa hora a irmã, comentando sobre alguns amigos dele diz mais ou menos o seguinte: " Muitas vezes, ele gostava de ir com algum amigo para a costa de Suffolk à noite. E sempre, na escuridão da noite, ele gostava de ficar ouvindo o som das ondas na praia...” Lembro-me disso ao ler esses versos:

E o tempo me disse
Para não pedir por mais
Algum dia nosso oceano
Vai encontrar a sua praia

Qual a dificuldade desse oceano encontrar a praia?

Enfim... só mais um detalhe (acho que matador!):

O tempo me disse
Você chegou com o amanhecer
Uma alma sem pegadas
Uma rosa sem espinhos

William Blake, um dos maiores poetas do romantismo inglês (de quem Drake gostava muitíssimo) e também muito “suspeito” quando o tema é homossexualidade, uma vez escreveu em um poema sobre um amor impossível (do tipo que “não ousa dizer seu nome”), que ele vinha sempre “feito alma que não deixa rastro... rosa infértil, mas sem espinhos...”. Mais alguma dúvida? (rs)


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